Disciplina - Matemática

Matemática

22/06/2009

Livro "Numerati" revela classe de profissionais "espiões"

Uma classe recente de profissionais tem a missão de perscrutar sequências numéricas atrás de informações sobre pessoas. Engenheiros da computação e matemáticos, ganharam o nome de "numeratis" e atuam em grandes corporações tentando decifrar pela lógica matemática a complexidade humana, até traços de personalidade, como gosto, preferências musicais ou qualquer outro.
Parece mais uma boa história de conspiração, uma ficção, mas no recém lançado "Numerati", o jornalista dos Estados Unidos, Stephen Baker, apresenta esta classe de anônimos profissionais enclausurados por detrás de zeros e uns, e com capacidade para escarafunchar a vida de qualquer um que utilize meios eletrônicos digitais - cartões de crédito, celular ou que deixe seus rastros pela internet - e quem não deixa quando navega?
Há mais de 20 anos, Baker escreve para a publicação "Business Week", além de publicar em veículos como "Wall Street Journal" ou "Los Angeles Times", e é um dos editores do "Blogspotting.net", considerado pelo New York Times um dos cinquenta blogs imperdíveis. Vive em Montclair, Nova Jersey.
“Seja lá quem ou o que você for – e cada um de nós é um monte de coisas –, as empresas e governos querem identificá-lo e localizá-lo. Pense nisto: o Google tornou-se uma sensação multibilionária ajudando-nos a encontrar as páginas certas da web. Quão mais valioso será, em todos os setores imagináveis, encontrar a pessoa certa? Essa informação vale fortunas e os dados pessoais que descartamos deixam inúmeros rastros de quem somos. Mesmo que você não revele o nome, é fácil encontrá-lo”, afirma Baker no livro.
Que os humanos há muito são registros numéricos, isso já se sabe. Mas nunca antes como agora houve tantas tentativas de se antecipar o que vamos escolher para comprar no Natal, o destino turístico que queremos para nossas férias, o voto na próxima eleição, uma quase infinidade de opções que tomamos como cidadãos e consumidores.
Tudo para "facilitar nossa vida", mas a que custo? Na entrevista abaixo feita através de correio eletrônico, o escritor fala um pouco dos numerati, como ele mesmo batizou esses profissionais. Stephen Baker contribui para a Business Week há mais de vinte anos. Seus textos têm aparecido em várias publicações, inclusive Wall Street Journal, Los Angeles Times, Boston Globe e Philadelphia Inquirer. Ganhou o prêmio do Overseas Press Club por seu painel do crescimento da indústria automobilística mexicana. Baker é um dos editores do Blogspotting.net, considerado pelo New York Times um dos cinquenta blogs imperdíveis. Vive em Montclair, Nova Jersey.
EPTV.com - O que o atraiu para o tema? Houve alguma experiência pessoal que o levou a escrever sobre os numerati, do tipo um problema com catão de crédito, algo assim?
Stephen Baker - Eu estava escrevendo uma história sobre matemática para a BusinessWeek. A idéia original era mostrar como a matemática era importante para a tecnologia e para a competitividade nacional. Mas, quando eu estava na IBM Research, aprendi sobre como a organização está analisando dados de 50 mil de seus próprios funcionários, tentando construir modelos matemáticos sobre eles. De repente, me ocorreu que, se a IBM pode fazer isso com seus funcionários, outras empresas e o governo devem estar vasculhando nossos dados para definir nossos padrões como consumidores, pacientes, eleitores e terroristas potenciais. Essa foi a idéia para meu livro.
EPTV.com - Além de perfil para o mercado, o que implica nas nossas vidas tantas análises numerológicas? Não é uma redução de tudo o que o ser humano representa?
SB - Desde que “saímos das cavernas”, nós humanos temos tentado entender a nós mesmos? Por que nós nos comportamos dessa maneira? Por que matamos uns aos outros? Será que há algum modo de de descobrir quais de nós estão mais propensos a ser um assassino, um futuro marido ou esposa, ou um grande líder? Para responder a todas essas perguntas, nós analisamos dados: A maneira como uma pessoa anda ou se veste; em que ela está interessada; como são seus pais e irmãos. Isso é análise de dados. Os Numerati estão fazendo o mesmo trabalho, mas com muitos dados novos, poderosas máquinas para processar tais informações e matemática sofisticada. O objetivo continua: entender a nós mesmos. Além do marketing, essa análise será usada para prever quais funcionários desempenharão efetivamente certas tarefas, quais pacientes se beneficiarão de certos medicamentos e quem poderá instalar uma bomba em um ônibus, por exemplo.
EPTV.com - Você chega a considerar tais práticas como uma espécie de "vigilância" ou como algo que pode nos ajudar?
SB - Isso é vigilância, mas é também algo que pode nos beneficiar. Se nós encontrarmos a cura para o câncer ou para a esclerose múltipla, isso provavelmente será resultado do reconhecimento de padrões encontrados em meio a imensos campos de dados. Esse é o trabalho dos Numerati. No meu capítulo sobre “pacientes”, pesquisad
ores da Intel estudaram os movimentos de idosos no cotidiano de suas casas. Se por meio dessas análises eles podem detectar que as pessoas estão perdendo massa muscular ou estão sob o risco de uma quada catastrófica, é possível afirmar que está se praticando vigilância e [ao mesmo tempo] realizando um serviço valioso. A questão é como podemos tirar vantagens desses avanços sem sacrificar nossa privacidade ou liberdade.
EPTV.com - Sempre brincamos que estamos sendo reduzidos a números com identidade, conta em banco, senhas etc. Estamos de fato?
SB - Somos números há muito tempo. Soldados, trabalhadores e pacientes têm sido reduzidos a números em campos de batalha, fábricas e hospitais. A diferença agora é que estamos sendo transformados em combinações numéricas extremamente complexas. Em vez de nos simplificar com números, os Numerati estão lutando para entender nossa complexidade.
EPTV.com - Esses dados podem implicar, de alguma forma, em invasão de privacidade?
SB - Pode ser invasão de privacidade. É por isso que eu acho importante que as pessoas entendam como seus dados podem ser usados, e saber mais sobre como se proteger. A privacidade terá que ser redefinida para a era na qual estamos entrando. Vou lhe dar um exemplo. Vamos supor que uma pessoa é portadora do HIV, o vírus que leva à Aids. É muito provável que ela não queira que seu empregador saiba disso. Mas ela pode querer contribuir com seus dados em pesquisas direcionadas à cura da doença. A solução seria fornecer informação anonimamente. Precisamos das ferramentas certas para fazer isto, e garantias legais de que nossas identidades não serão reveladas.
EPTV.com - No romance "O Guia do Mochileiro das Galáxias" ("The Hitchhiker's Guide to the Galaxy"), de Douglas Adam, depois de muito calcular, um computador responde que o sentido da existência é "64". Você acha que estamos no aproximando da ficção com estas "sínteses matemáticas" feitas pelos numerati a nosso respeito?
SB - Nossos números são muito mais complexos que 64. E a cada mês, eles estão ficando mais e mais complexos. As equações do Numerati estão longe de se aproximar da vertiginosa complexidade do ser humano. Mas eles estão indo nessa direção.
EPTV.com - Por fim, tem como escapar desses numeratis?
SB - Só poderemos escapar dos numerati se deixarmos de usar certas ferramentas da vida moderna: cartões de crédito, telefones celulares, internet, mencionando apenas três. Isso é cada vez mais difícil, e se tornará ainda mais nos próximos anos. Empresas nos cercam com câmeras de segurança, traçam e analisam nossos movimentos e comportamento por meio do telefone. A chave para mim não é escapar dos numerati, mas descobrir quais aspectos da privacidade se deseja preservar e quais fatores são menos importantes. Eu afirmo no livro que os Numerati podem, na verdade, nos ajudar em muitas áreas da nossa vida, incluindo saúde e amizades. Mas é muito importante saber o que eles estão dispostos a fazer, e ficar de olho neles.

Fonte: EPTV.com
Recomendar esta notícia via e-mail:

Campos com (*) são obrigatórios.