Disciplina - Matemática

Matemática

29/10/2010

Cego e genial

Por: Adalberto Nascimento
O termo sudoku, embora pareça estar exclusivamente relacionado com o nove, é uma espécie de acrônimo de algo como “os algarismos devem ser únicos”, em japonês
O número nove é evitado pelos japoneses devido ao fato de sua pronúncia (“ku”) ser parecida com a de outra palavra que significa dor ou preocupação - em japonês, é claro. Não obstante, o joguinho chamado sudoku tem muitos aficionados, principalmente no Japão. O termo sudoku, embora pareça estar exclusivamente relacionado com o nove, é uma espécie de acrônimo de algo como “os algarismos devem ser únicos”, em japonês. No entanto, o nove é significativo nesse jogo, pois o objetivo é a colocação adequada de números de 1 a 9 em cada uma das células vazias de uma grade 9 por 9. O jogo, em si, não tem nada de matemática, uma vez que os algarismos podem ser substituídos por nove figuras quaisquer.
Leonard Euler, o criador desse jogo, é considerado um dos maiores matemáticos de todos os tempos. Um ser fascinante de cuja vida faremos um breve relato.
Euler (pronuncia-se “oiler”) nasceu num local próximo de Basileia, na Suíça, em 1707. Seu pai, um pastor luterano, queria que ele seguisse a mesma carreira. A história está repleta de casos em que filhos de pastores optam por profissões diferentes daquelas que seriam os desejos paternais. Em geral tornam-se cientistas, recorrentemente matemáticos e, muitas vezes, são germânicos, obviamente por decorrência da origem de Lutero. O fato é que uma obsessiva preocupação daqueles pais para com a educação dos filhos fica bastante evidenciada.
Aos 14 anos, Euler começou a frequentar a Universidade da Basileia, tendo a sua vocação notada pelo famoso professor Johann Bernouilli. Este convenceu o pai de Euler de que seu filho tinha uma aptidão extraordinária para a matemática. Euler foi o único aluno que consta ter sido elogiado por Johann em detrimento ao filho Daniel que, também genial, foi seu aluno.
Aos 19 anos, Euler ficou em segundo lugar num concurso da Academia de Ciências de Paris. Tratava-se de uma análise matemática para a melhor colocação de mastros num navio em alto-mar. Euler fez seu trabalho sem nunca ter visto o mar e sequer um navio. Era, como nós, do interiorzão.
Influenciada por dois dos filhos de Johann Bernouilli - Daniel e Nikolaus (craques em matemática) -, a rainha Catarina I da Rússia, em 1726, convidou Euler para integrar o corpo docente da Academia de Ciências de São Petersburgo.
Em 1733, ele ocupou a cátedra de matemática da Academia e sua produção em diversas áreas dessa disciplina foi absurdamente acentuada.
Em 1735, Euler resolveu o famoso “problema da Basileia”: achar o resultado da soma da série infinita dos inversos dos quadrados dos inteiros positivos (para detalhes, vide Internet).
Até 1741 Euler inundou a Academia de São Petersburgo com trabalhos matemáticos originalíssimos. E ele escrevia com os filhos no colo e ao seu redor. Carregar todos seria impossível. Pacientemente, Euler escrevia brincando com eles, que eram treze. Era um pai bondoso. E continuou dando mostras de bondade para com os pimpolhos, mesmo depois de perder a visão do olho direito, em 1738.
Em 1741, ele aceitou o convite de Frederico II da Prússia para trabalhar na Academia de Ciências em Berlim, até porque em São Petersburgo “a coisa estava ficando russa”. Intrigas palacianas e fofocas eram coisas intoleráveis para Euler.
Foi em Berlim que Euler descobriu a equação considerada a mais bela da história - a que relaciona os números e, pi e i (para detalhes, vide Internet). Durante o período de 25 anos em Berlim, Euler escreveu o que é considerado o primeiro best-seller de divulgação científica. Trata-se de “Cartas a uma princesa alemã” - uma compilação das suas aulas de ciências para a princesa de Anhalt-Dassau. Todavia, depois do longo período em Berlim, Euler começou a ficar incomodado com a preferência de Frederico II pelos eruditos franceses e com a aporrinhação a que era submetido por Voltaire, que o ridicularizava publicamente. O filósofo francês, por sinal, não se dava bem com os germânicos. Prova disso é que na obra “Cândido, ou o otimista” ele satiriza Leibniz - filósofo e matemático alemão.
Enfim, saturado com a Prússia, em 1766, Euler volta à Rússia a convite de Catarina II. Como vemos, ele dava sorte com as Catarinas.
Em 1771, o matemático suíço perdeu substancialmente a visão do olho esquerdo, ficando praticamente cego. Mas não se deu por vencido; valeu-se de sua prodigiosa mente e do auxílio de assistentes, que escreviam o que ele ditava. Cego, ditou um tratado científico de primeira grandeza, com 775 páginas.
Euler morreu no dia 18 de setembro de 1783. Sofreu um acidente vascular cerebral quando estava fazendo cálculos sobre a órbita de Urano, planeta descoberto meses antes.
Nessa data, o mundo perdeu um gênio da matemática que, ironicamente, entre tantas outras obras, escreveu “Dioptrica” - um portentoso trabalho sobre ótica.
Adalberto Nascimento é engenheiro.
Este artigo foi publicado em 24/10/2010 no sítio Cruzeiro do Sul. Todas as informações nela contida são de responsabilidade do autor
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