Disciplina - Matemática

Matemática

29/10/2010

A matemática pode ser mais artística do que se pensa, diz doutor Caribou

Por: Diego Assis
Quem olha para Dan Snaith ou escuta a música cerebral de seu projeto Caribou logo imagina o sujeito trancado em um quartinho no Canadá por horas a fio, costurando samples e texturas e compondo freneticamente em seu laptop. Mas a imagem do cientista maluco do ritmo está com os dias contados. Aos 32 anos, vivendo em Londres e prestes a desembarcar no Brasil pela primeira vez com o seu trabalho mais dançante – o álbum “Swim” –, Snaith garante que, agora, só quer saber de festa.
Já conhecido pelo nome artístico de Manitoba, que teve de abandonar por questões jurídicas, o fundador do Caribou subiu duas vezes ao palco do Clash Club, em São Paulo, na noite desta quarta-feira (27). Na primeira, apresentarou faixas do novo disco e de trabalhos anteriores, como “The milk of human kindness” e “Up in flames” , em um show enérgico com banda, que inclui duas baterias montadas frente a frente, baixo, guitarra, teclados, samplers e projeções em vídeo que são acionadas por pedais pelo guitarrista.
“A gente se posiciona bem próximo, no centro do palco, para ter um contato mais direto, olho no olho”, explica o líder do Caribou, que, no show, toca bateria, canta e ainda aciona algumas teclas em seu laptop. “Estou muito feliz com esse formato ao vivo. É o que sempre quis fazer, com espaço para o improviso, o intuitivo e o interativo ao mesmo tempo.”
Depois da obrigação, a diversão: ao final da noite, Snaith voltou ao palco para fechar a balada com um DJ set. “Discotecar, para mim, sempre foi uma forma de poder compartilhar a música que tem me empolgado”, disse, sem especificar o que vai tocar. “Toco coisas que fazem as pessoas dançar, velhos e novos discos. Depende do clima do lugar e de como estiver me sentido”, despista.
A experiência recente como DJ teve influência direta na sonoridade de “Swim”, lançado em abril último na América do Norte pelo selo Merge e considerado um dos melhores do ano na música eletrônica. “Fiz [o disco] especificamente para as pessoas dançarem. Acho que vivemos uma boa época para a dance music”, comenta, listando como principais referências produtores de Berlim, Detroit e o amigo e DJ James Holden, uma das revelações do minimal tecno e da IDM londrina.
Artista da matemática
Para além da paixão pelos bleeps e blops eletrônicos, Snaith e Holden compartilham outra característica menos conhecida: ambos são matemáticos sérios. Formado pela Universidade de Toronto em matemática, o criador do Caribou foi adiante nos estudos e, em 2005, tornou-se phD, pela Universidade de Londres, em “Símbolos Modulares Siegel Superconvergentes” – seja lá o que isso signifique.
“É impossível de explicar. Bem que eu gostaria. Mas, francamente, todas aquelas palavras têm um significado específico, que é baseado em outra definição que, por sua vez, é baseada em outra. Gostaria de poder dizer que é algo que se relaciona com alguma coisa na vida real, mas não é. Não consigo te dar uma definição que faça sentido em um minuto, em uma hora, em um dia ou mesmo em uma semana”, lamenta. “É uma coisa mais abstrata, um exercício mental de que gosto e que me desafia.”
A intimidade com os números e fórmulas matemáticas indecifráveis, no entanto, pouco tem a ver com a aparente complexidade da música de Caribou, já descrita por críticos como “um sonho sinfônico”, “uma viagem psicodélica e polirítimica para um lugar desconhecido” ou “arte para os ouvidos”.
“Acho que a maioria das pessoas me imagina fazendo música com uma fórmula em mente, de um modo racional e analítico. Não é assim que eu trabalho: uso mais a emoção e a intuição. Mas o que surpreende mais as pessoas é que a matemática também pode ser assim - intuitiva, emocional e mais artística do que as pessoas pensam”, defende o “doutor” Snaith.
Mas apesar do rótulo de “dance music inteligente” que ele e alguns outros nomes mais “cabeçudos” da música eletrônica como Aphex Twin, Boards of Canada e Four Tet já receberam, Snaith reconhece que o setor também passa por suas crises de neurônios.
“Concordo que o pop emburreceu. Mas não é de hoje. A música eletrônica está em toda parte, no hip hop, no r’n’b, na house ou dance music, mas o que as pessoas veem é só uma parte pequenininha. Esse é um problema histórico: a maioria das músicas são realmente muito chatas. Poucas pessoas se interessam por uma música mais desafiadora e ideias estranhas – e isso não é só na música eletrônica ou dance, acontece em todo gênero.”
Esta notícia foi publicada em 27/10/2010 no sítio G1. Todas as informações nela contida são de responsabilidade do autor.
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