Disciplina - Matemática

Matemática

04/04/2012

Prêmio Internacional Fernando Gil entregue a historiador italiano

Prêmio Internacional Fernando Gil, na área da filosofia das ciências, foi atribuído a Niccolò Guicciardini, especialista italiano na área da História das Ciências Exatas.
Niccolò Guicciardini, especialista em história das ciências exatas e professor de História da Ciência da Universitá degli Studi di Bergamo, em Itália, é o vencedor do Prémio Internacional Fernando Gil 2011, atribuído pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e pela Fundação Calouste Gulbenkian.
O prémio instaurado em honra do filósofo português Fernando Gil, vai na segunda edição e este ano distingue o trabalho do professor italiano que deu origem à obra ‘Isaac Newton sobre a Certeza Matemática e o Método’. Uma obra que mostra como as ideias de Newton estão ainda atuais.
Niccolò Guicciardini explica que: «o que tem de interessante é que descobrimos uma nova forma de olhar para as relações entre a álgebra e geometria, digamos assim. Hoje em dia, os matemáticos estão interessados em usar, por exemplo, computadores na resolução dos seus problemas e as soluções que conseguimos com os computadores são normalmente soluções gráficas, são de alguma forma soluções geométricas. E portanto, hoje em dia estamos à procura da relação entre o que é álgebra e simbólica e o que é visual e geométrico de formas diferentes. E as ideias de Newton ainda têm alguma coisa para nos dizer sobre este assunto».
Mas a investigação de Niccolò Guicciardini levou-o a uma análise dos recursos utilizados por Newton e Descartes para resolverem o mesmo problema, como no caso do Problema de Pappus.
«Descartes usou a álgebra e Newton usou a geometria. Essa é a principal diferença», afirma o especialista e explica que «Descartes representou curvas através de equações, enquanto Newton concebeu curvas geradas por mecanismos que podem ser os mecanismos com que um pintor produz uma curva ao projetar uma curva de um ponto a outro ou um arquiteto consegue construir uma curva ao usar um dispositivo de desenho».
Para o premiado, não há dúvida de que Newton reformulou a matemática. «Quando ele era jovem, foi o homem certo no local certo. Ele teve uma mente muito astuta e uma grande habilidade na matemática. Foi para Cambridge no momento em que os matemáticos definiram como ‘o Isaac Barrow esteve lá’. E o Newton foi inspirado pelo Barrow e também por Descartes, ao ler a Geometria de Descartes».
O especialista acrescenta ainda sobre Newton que: «foi um mestre na manipulação de símbolos, mas o que foi interessante é que em poucos anos tornou-se um grande crítico deste tipo de matemática. Portanto, no início ele deu grandes contributos para a nova álgebra simbólica e matemática e podemos dizer, de forma simplificada, que ele descobriu aquilo que hoje denominamos por cálculo diferencial e integrado, usando os termos de Leibniz. Mas depois de alguns anos, o Newton começou a ler os trabalhos dos antigos geómetros como Euclides e Apolónio e ficou convencido que estes métodos eram preferíveis. Isto parece um suicídio. Newton está a fazer aqui alguma coisa de errado. Mas aquilo que achei empolgante foi que o que o Newton estava a fazer poderia ser defendido por razões que atualmente os matemáticos e físicos consideram alternativas viáveis como coisas interessantes que podem ser feitas».
Filosofia da matemática. Uma disciplina, que na opinião do Professor italiano tem vindo a sofrer alterações.
«Hoje em dia os filósofos da matemática levam muito a sério aquilo que os matemáticos fazem na sua prática. E esta é uma nova forma de interagir com os cientistas praticantes e esta nova tendência na filosofia da matemática é algo que também acontece na filosofia da física ou da economia e noutros campos. Isto é, os cientistas praticantes precisam de repensar os seus métodos, os conceitos nos quais baseiam a sua investigação e hoje em dia, os filósofos sentem que têm de ‘sujar as mãos’ com as coisas reais e evitar um tipo de poltrona da filosofia, na qual se pensa em grandes ideias mas em que não se lida com as verdadeiras práticas científicas», explica o Professor.
Mas afinal, qual a importância da filosofia da matemática para a atual investigação em matemática?
«Eu não acho que muitos matemáticos acharão as considerações filosóficas essenciais para a disciplina. Existem muitos bons matemáticos que ignoram tudo isto. Mas primeiro existem matemáticos que estão interessados em repensar os métodos e os conceitos da disciplina. E em segundo lugar, ao colocar a matemática num contexto cultural como fazemos quando fazemos história e filosofia da matemática. Nós restituímos à matemática a dimensão cultural que é benéfico para os matemáticos e para a cultura matemática no geral», explica.
Em Lisboa, para receber o Prémio Internacional Fernando Gil, o professor italiano recorda o filósofo português com grande admiração.
«Eu era um estudante, tinha 23 ou 24 anos, ele foi a Itália para dar umas aulas em Milão e também num encontro numa Vila, que se chama Garniano del Garda. Eu estava lá e estava a seguir as aulas dele. E lembro-me muito bem que nós não podíamos discutir com aquele importante filósofo. Após as apresentações, talvez bebendo um café. E ainda me lembro como ele foi querido e útil com os estudantes. Lembro-me que uma colega minha perguntou-lhe uma questão filosófica muito difícil. E ele parou por cinco minutos a pensar naquilo e depois respondeu de uma forma muito precisa e inspiradora. E isto foi para mim uma lição de honestidade intelectual. Porque ele não evitou a questão, ele não deu a primeira reposta que tinha em mente. Mas reconheceu que era uma pergunta difícil e que uma estudante lhe propôs uma questão que merecia atenção. E é desta atenção aos estudantes e desta honestidade intelectual, que eu me lembro», lembra Niccolò Guicciardini.
Um prémio que para além do valor simbólico, é para o especialista essencial para divulgar o trabalho que desenvolve.
«É uma grande honra, obviamente. Dará um grande impulso à minha investigação. E espero que me permita pôr em contacto com mais académicos porque é um prémio de muito prestígio e uma coisa inesperada que aconteceu comigo. E estou confiante que o meu livro vai ser lido por muitas pessoas, e que eu possa receber um feedback importante das reações que eu espero receber. O diálogo entre mim e o mundo da aprendizagem e os outros académicos é muito reforçado pelo facto de ter recebido esta honra fantástica, por receber este prémio», afirma Niccolò Guicciardini.
O Prémio Internacional Fernando Gil, no valor de 125 mil euros, tem como grande objetivo homenagear a memória e a obra do filósofo português Fernando Gil, que faleceu em 2006.
Esta notícia foi publicada no dia 04/04/2012 no TV Ciência Online. Todas as informações nela contida são de responsabilidade do autor.
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